EU APRENDIZ : A LIÇÃO DELA!



Apague a luz. Deite ao meu lado.
Hoje eu vou guiar teu desejo. Você vai procurar o meu.
O único sentido que não vamos usar é a visão.
Vamos ser cegos por algumas horas, buscar os outros quatro sentidos que achamos que usamos entre nós.
Comece lendo meu corpo nas pontas de seus dedos. Desvende meus poros, sinta meus pelos, percorra meus braços, meu ventre, meu rosto. Sinta em minhas costas o caminho que vai do pescoço até o cóccix. Sabia que tenho covinhas em minhas ancas? Tente gravar o que seu tato lê.
Segure minha mão, meus seios, apalpe meu quadril, aperte meus braços, minhas pernas, sinta.
Agora, apure o olfato, como um animal, me cheire. Cheire meu pescoço, minhas reentrâncias, cheire o ar que se desprende de mim, perceba o aroma que só eu tenho.
Eu sei o seu. Você cheira a mato, a folha que recém caiu, cheira a terra depois da chuva.
Qual é o meu? Descubra.
Ouça. Me ouça. Qual a frequência dos meus suspiros, meus gemidos, quantos decibéis têm meus gritos?
Entro no seu prazer pelo som? Você entra no meu pelo riso alto, pelo som gutural. Você cerra os dentes e deixa passar o ar entre eles, como um assovio.
Prove meu gosto, desenhe com a língua seu nome em minha pele, escolha o lugar. Sinta o sal que tenho no suor e o sabor adocicado de minha seiva. Conheço teu gosto agridoce quando o prazer explode. Detenha-se, conheça, explore.
Faço com você o que nunca fiz, permito que me conheça.
Quando apagamos a visão, entendemos o que o outro quer. Essa é a grande vantagem dos cegos, enxergar além do que os olhos vêem. Porque ver e enxergar são duas coisas distintas.
Ver é captar a imagem, enxergar é entender o que vê. Na ponta dos dedos se enxerga melhor.
Ouvir, também, é diferente de escutar. Escutar fica na superfície, ouvir é mais profundo. Escuto qualquer coisa, ouço o que me interessa.
Comer não é degustar. Como prá sobreviver, degusto o que me dá prazer. Prove meu sabor.
Propus essa expedição porque  quero que você conquiste seus sentidos, anule a razão e se perca na intensidade do desejo, não só físico.
Não facilite a entrega, não apresse o gozo, não menospreze o prazer. Prolongue o desejo.
Caminhe na ponta dos dedos, libere o tato.
Defina o perfume que exalamos, juntos, use a memória olfativa.
Tenho lembrança de outros perfumes, gravei o teu.
Onde estiver, com ou sem você, vou lembrar do teu cheiro.
E o gosto? Posso provar milhões de sabores, o teu será único.
Quero que você me descubra e me faça especial.
Você vai se lembrar de mim, vai sentir que não me visitou, viveu em mim.
Vai me associar a cheiros que virão de fora, maresia, terra molhada, alguma fruta, qualquer flor.
Vai me ouvir no som do rio correndo, da onda batendo, do vento uivando ou do que me represente em sua memória.
E sua lingua vai guardar o gosto que só eu tenho e só você sabe qual é.
E quando sua sensibilidade estiver apurada, talvez eu te mostre um caminho que só as mulheres conhecem, a intuição.
Mas o sexto sentido só vai aflorar quando todos os outros puderem ser usados sem treino, espontâneamente.
Porisso, vamos às aulas, comecemos do início.
Tente ser um aluno aplicado, o que estou ensinando não é só prá mim, é prá depois de mim, também.
No escuro, você vai entender o que significa estar com quem se quer.
Vem, me dê sua mão. Apague a luz.

7 comentários:

  1. Belíssima, invejável e compreensível exigência...
    Paulo, beijos!

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  2. SHIRLEY,

    também concordo!

    Um abração carioca.

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  3. PIEDADE ARAÚJO SOL.,

    o seus dois blogues são excelentes.

    E seja muito bem vinda,certo?

    Espero por você mais vezes e se me dá licença, vou apagar novamente a luz.

    Um abração carioca.

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  4. Bom demais quando dois se entregam a tarefa de exploração do prazer,
    da tecitura da pele, do cheiro das dobras, dos suores, do amor.
    Perfeito!

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    1. CYNTHIA,

      bom e extremamente necessário para a vida harmônica do ser humano!

      Um abração carioca

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  5. Tema mui bem pensado, parece que no escurinho a sensibilidade aflora, e o tato torna-se mais palpável! Excelente texto , Paulo! Abçs!

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